segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Por que a greve perdura nas Universidades estaduais


Desde maio deste ano as universidades públicas paulistas enfrentam a intransigência de seus respectivos reitores. Estes, sob a alegação de crise financeira, sustentam a impossibilidade do reajuste salarial que repõe anualmente a inflação, procedimento acordado há anos com as categorias de funcionários técnico-administrativos e professores. As recentes ofertas de abono e aumento no vale-alimentação, como se sabe, tratam de valores que não se incorporam ao salário base. O abono, em especial, aplica-se exclusivamente a um pagamento, e só. Por isso, funcionários e professores de USP e Unesp, mais os funcionários da Unicamp, permanecem em greve pela defesa de seus salários e condições de trabalho.

Ainda que haja alguma verdade técnica no argumento da sobrecarga da folha de pagamento (os números apresentados pelas reitorias às entidades sindicais são confusos e obscuros, por vezes mesmo contraditórios) a intransigência na resolução do problema é claramente um artifício político. Há anos que os sucessivos governos do PSDB em São Paulo resistem em aumentar o percentual de repasse do ICMS que cabe às universidades (atualmente em 9,57%). Essa resistência ocorre ao mesmo tempo em que se promove um desordenado processo de expansão. Não se aumentam os recursos, mas se aumentam os campi, os cursos e a carga horária de trabalho dos professores, que vão se transformando em exaustos “auleiros”, sem tempo nem recursos para o desenvolvimento de suas pesquisas e, portanto, para a manutenção dos conhecidos padrões de excelência das universidades públicas paulistas. Segundo informações do Fórum das Seis (organização que congrega entidades de funcionários e professores das três universidades estaduais), nos últimos 17 anos o número de alunos cresceu em torno de 93%, índice muito acima da contratação, no mesmo período, de funcionários e docentes.

Essa história é conhecida. O velho discurso tecnicista das crises de orçamento, da necessidade de “enxugamento da máquina”, etc, sempre foi a antessala de predatórios processos de privatizações no País. Privatizações que, via de regra, significaram dinheiro de banana para os cofres públicos e milhares de trabalhadores demitidos, no interesse de poucos conglomerados financeiros que abocanharam o patrimônio nacional. Assim foi com a siderurgia e a mineração nacionais (Usiminas, CSN e Vale do Rio Doce) e com os bancos estaduais (na lógica do “sucatear para privatizar”). Assim está ocorrendo com a previdência social, a saúde e a educação pública em todos os níveis. 

Após os oito anos de governo FHC sem aumento salarial para as universidades federais, agora o cerco se fecha sobre as universidades públicas de São Paulo. A inédita e alarmante proposta cogitada pelo reitor da USP, Marco Antonio Zago, de um programa de demissão voluntária para funcionários e redução no regime de trabalho de professores mostra que as elites governantes paulistas avançam mais um passo no processo gradual de privatização das universidades do estado. As próximas etapas são conhecidas e prováveis: busca de recursos junto a empresas privadas, o que comprometerá ainda mais as pesquisas científicas independentes e voltadas para os interesses da comunidade. 

Eis o que parece ser o motivo de fundo da resistência ao aumento de verbas que poderiam manter a qualidade do ensino e da pesquisa e viabilizar um diferente e bem sucedido processo de expansão dessas universidades: entregá-las às estratégias do capital privado e precarizar as condições de trabalho de funcionários e professores ao amarrá-los à rasa lógica produtivista do “mercado educacional”. A conclusão desse processo será uma vertiginosa queda da qualidade do ensino e uma pesquisa voltada para os interesses de meia dúzia de conglomerados empresariais. É contra esse cenário, que se insinua num horizonte próximo, que lutam e resistem os dignos e honrados funcionários e docentes que se mantêm mobilizados e em greve contra a intransigente e antidemocrática postura de seus reitores.

Leandro Galastri
Prof. de Ciências Politicas da UNESP- FFC

0 comentários:

Postar um comentário